top of page
  • Ícone do Instagram Preto
Buscar

Negociar com um adolescente: o desafio de amar sem perder o rumo

  • 16 de jul.
  • 4 min de leitura

ree

Ninguém nos preparou para isto. Nem os livros, nem os cursos, nem os conselhos bem-intencionados. A verdade é que, quando os nossos filhos chegam à adolescência, tudo o que funcionava antes parece perder a validade. E negociar com eles torna-se, muitas vezes, um campo minado de emoções.

Negociar. Que palavra estranha, não é? Como se estivéssemos numa mesa de reuniões e não dentro de casa, a tentar manter a harmonia com quem mais amamos. Mas negociar, nesta fase da vida dos nossos filhos, é mais do que uma estratégia — é um gesto de amor. Um amor que reconhece que o controlo já não funciona. Que os “porque sim” e os “faz porque eu mando” já não chegam. Um amor que se transforma em escuta, em presença, em esforço para encontrar um meio-termo, mesmo quando tudo dentro de nós grita por regras, ordem e obediência.

É difícil, claro que é. Principalmente porque crescemos a acreditar que negociar era ceder. E agora temos de aprender que negociar com um adolescente é, na verdade, educar de forma mais madura. É abrir espaço para que eles se sintam ouvidos e, ao mesmo tempo, manter os limites que os protegem.

E depois há algo que ninguém nos diz, mas que é talvez o mais difícil de aceitar: nós idealizamos os nossos filhos. Desde pequenos, vamos projetando neles tudo aquilo que conhecemos, o melhor que acreditamos que são, os talentos que observamos crescer, a doçura que carregavam. Criamos, quase sem perceber, uma imagem futura deles. Quem se vão tornar, o que vão gostar, como irão agir. E de repente… na adolescência, essa imagem desmorona. Não porque eles se tenham perdido, mas porque estão a renascer. A ser outra coisa. A descobrir quem são — e muitas vezes isso colide com aquilo que esperávamos. E dói. Dói muito.

Sabemos, racionalmente, que não devíamos criticar, mas criticamos. Que não deveríamos julgar, mas julgamos. Que o amor devia ser incondicional, mas vacilamos. E há uma dor quase invisível nesse luto silencioso: o de perceber que aquele filho que idealizámos talvez nunca exista como o imaginámos. Que a realidade é outra — mais desafiante, mais complexa. Mas é também essa realidade que nos ensina a amar de forma mais genuína. Sem moldes, sem garantias. Só com presença. É aí que o amor amadurece. É aí que aprendemos a aceitar que a pessoa que se está a formar diante de nós também precisa que deixemos partir a imagem que tínhamos — para podermos abraçá-la como realmente é.

E negociar com um adolescente torna-se ainda mais desafiante quando, de repente, percebemos que a nossa casa deixou de ser aquele espaço cheio de presença e partilha. É como se se transformasse apenas num dormitório, onde eles vêm para dormir, comer, ter a roupa lavada, reivindicar, exigir... e sair. Há dias em que quase nos sentimos como meros prestadores de serviços, invisíveis nas suas urgências e necessidades. Vivem connosco mas parecem desconectados, e, ao mesmo tempo, continuam profundamente dependentes — emocionalmente, financeiramente e em tudo o que têm como garantido: comida feita, roupa passada, contas pagas.

É um paradoxo doloroso. Estão ali, tão perto, e ao mesmo tempo tão longe. E torna-se difícil gerir alguém para quem, aparentemente, deixámos de ter importância. A nossa opinião é sistematicamente desvalorizada, cada sugestão nossa é vista como invasão, e tudo o que dizemos parece ser imediatamente contradito — apenas para se posicionarem, para sentirem que têm poder de escolha, para tentarem encontrar quem são. E nós… nós ficamos no lugar de quem observa, por vezes em silêncio, escolhas erradas, caminhos que reconhecemos como arrependimentos futuros. E tentamos, com a melhor das intenções, prevenir. Alertar. Mas isso, na maioria das vezes, só gera ainda mais resistência.

Os quartos desarrumados, as portas a bater, o tom desafiador, o ar de quem já sabe tudo... dão cabelos brancos a qualquer mãe ou pai. Os nossos medos aumentam: as companhias, os valores, as decisões precipitadas, as atitudes que não reconhecemos como nossas — porque não foi assim que os educámos. E é nesse caos emocional que a negociação entra. Muitas vezes, sim, como uma espécie de chantagem emocional disfarçada de acordo: “Queres sair? Então arruma o quarto.” “Queres o telemóvel? Então ajuda com o jantar.” E de repente, damos por nós numa espiral de trocas, numa balança constante de pedidos e condições, onde os abraços espontâneos, os mimos e as conversas doces parecem ter sido empurrados para o fundo de uma gaveta que já não se abre com tanta facilidade.

E é aí que sentimos a impotência. Um desgaste emocional que nos consome em silêncio. Desistimos, muitas vezes, por puro cansaço. Porque já tentámos tudo. Porque já repetimos tudo. Porque já chorámos em silêncio depois de mais uma discussão, mais uma porta fechada, mais um olhar frio. Mas é tudo normal. Tudo isto faz parte deste processo em constante movimento. Nesta dança estranha entre a autonomia e a dependência, entre a rejeição e a necessidade de colo.

A negociação, apesar de tudo, é uma ponte. Frágil, por vezes tensa, mas necessária. É ela que vai permitir que, aos poucos, possamos ir ultrapassando estas diferenças. E sim, haverá retrocessos. Haverá vitórias. Haverá momentos em que sentimos que voltámos ao início de tudo e outros em que, por um segundo, aquele filho que conhecíamos reaparece — num sorriso, num pedido de ajuda, num gesto de carinho.

Negociar com um adolescente não é perder autoridade. É ganhar relação. E é essa relação que, com o tempo, será a base de tudo o resto. É ela que, um dia, quando os filhos forem adultos, os fará voltar. Confiar. Abrir o coração. Porque, lá atrás, mesmo no meio do caos, houve alguém que os escutou. Que não desistiu. Que esteve presente. Que soube amar com firmeza e com liberdade ao mesmo tempo.

E não há conquista mais bonita do que essa.

 
 
 

Comentários


bottom of page