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Gestão do tempo nos ecrãs: como equilibrar ligação e liberdade na adolescência

  • 16 de jul.
  • 4 min de leitura

Vivemos na era dos ecrãs. Eles estão em todo o lado: nos bolsos, nas mo

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chilas, nos quartos, à mesa. E se é verdade que os ecrãs fazem parte do mundo em que os nossos filhos crescem, também é verdade que nos colocam diante de uma das tarefas mais complexas da parentalidade moderna: ajudar a regular o uso da tecnologia sem transformar a relação com os nossos adolescentes numa batalha constante.

Comecemos pelo óbvio. Os ecrãs não são o inimigo. A questão nunca foi, e nunca deverá ser, eliminar completamente o uso de tecnologia — isso seria não só irrealista, como contraproducente. Os adolescentes de hoje crescem num mundo digital, e aprender a navegar nele com equilíbrio é parte do seu desenvolvimento saudável. A verdadeira pergunta é: como ajudá-los a construir uma relação consciente e responsável com os ecrãs, num tempo em que tudo os convida ao excesso?

A resposta não é simples. E antes de impormos regras, precisamos de compreender o que está em jogo. Os ecrãs oferecem aos adolescentes um espaço onde se sentem competentes, reconhecidos, ligados aos pares. Muitos deles encontram nas redes sociais uma forma de pertencer, de afirmar a sua identidade, de explorar interesses. E isso não é, por si só, negativo. O problema começa quando o tempo de ecrã substitui — em vez de complementar — experiências reais, relações presenciais, rotinas saudáveis e tempo de qualidade em família.

É nesta fronteira subtil que o desafio da gestão acontece. Muitos pais sentem que estão constantemente a pedir, a controlar, a tirar, a proibir. E muitos adolescentes sentem que estão constantemente a ser vigiados, criticados, punidos. A relação fica desgastada e o tema dos ecrãs torna-se uma fonte de conflito constante. Mas há formas de mudar este cenário — e tudo começa por uma mudança de foco: em vez de “quanto tempo estás no telemóvel?”, perguntarmos “o que estás a fazer aí? como te sentes depois de usares?”. A qualidade do uso é tão importante quanto a quantidade.

Sim, é importante haver limites. Não apenas porque “faz parte educar”, mas porque o cérebro adolescente, em desenvolvimento, ainda não tem maturidade para autorregular-se sozinho de forma consistente. A capacidade de adiar recompensas, avaliar consequências, gerir impulsos — tudo isto está ainda a construir-se. Quando dizemos “já chega de TikTok por hoje”, não estamos apenas a impor uma regra: estamos a funcionar como o córtex pré-frontal externo deles. Estamos a ser aquele suporte que ajuda a travar antes do excesso, a pausar antes do colapso.

Mas impor limites sem relação não funciona. E é por isso que a gestão do tempo nos ecrãs precisa de ser um tema conversado, refletido em conjunto e ajustado à realidade de cada família. Não se trata de controlar por controlar, mas de responsabilizar, de envolver os adolescentes nas decisões, de criar acordos claros que respeitem o equilíbrio entre liberdade e estrutura. “Podes usar o telemóvel depois de fazer os trabalhos.” “À noite, todos os dispositivos ficam fora dos quartos.” “Domingo à tarde é tempo offline para todos.” São pequenas decisões com grande impacto — principalmente quando são vividas com coerência por todos.

Importa também reconhecer o papel modelador dos pais. Não podemos exigir que os nossos filhos desliguem dos ecrãs se nós próprios vivemos com o telemóvel na mão a cada minuto livre. As crianças imitam. Os adolescentes observam — e criticam aquilo que não bate certo. Se queremos ensinar equilíbrio, temos de ser o exemplo. Desafiante, sim. Mas possível. E acima de tudo, essencial.

E, finalmente, há um ponto que não pode ser ignorado: muitos dos comportamentos de dependência digital que observamos nos adolescentes são apenas o reflexo de outras faltas — solidão, tédio, ansiedade, baixa autoestima, vazio relacional. Quando estamos atentos ao que está por trás do uso excessivo, mudamos a abordagem. Em vez de apenas tirar o telemóvel, procuramos preencher o que está em falta. E muitas vezes, o que está em falta é tempo de qualidade connosco. Presença verdadeira. Aquele tempo em que olhamos nos olhos e perguntamos, de coração aberto, “como estás mesmo?”.

Na minha opinião pessoal, há regras que têm de ser mesmo claras. Por exemplo, à mesa, durante uma refeição em casa ou num jantar fora, é impensável haver telemóveis. Este é um espaço sagrado de reencontro, de partilha, de humanidade, que precisa de ser preservado como tal. Além disso, na nossa família, optámos por usar o Family Link, uma aplicação que nos permite controlar o tempo diário de uso de tecnologia por cada filho. No nosso caso, definimos o limite de duas horas por dia, e conseguimos também estipular limites específicos por aplicação — por exemplo, um máximo de 30 minutos de Instagram. Mas cada família encontrará o seu próprio equilíbrio, e o importante é que esse equilíbrio seja refletido e ajustado com consciência.

A verdade é que o problema dos ecrãs não se resume ao tempo. Existe um universo de perigos reais que nem sempre os adolescentes conseguem antecipar. Há redes de pedofilia que recrutam através de jogos online ou conversas aparentemente inocentes. Há esquemas de manipulação emocional e de captação de informação pessoal que apanham os jovens desprevenidos. Há estímulos constantes a padrões de consumo, comportamentos autodestrutivos ou distorções da imagem corporal que entram sorrateiramente nos conteúdos que consomem. Nós, pais, não temos controlo sobre tudo isso. E isso é assustador. Porque amamos e queremos proteger, mas sentimos que há um mundo inteiro que entra pela porta sem pedir licença.

É por isso que não devemos ter medo de conversar sobre estes temas. Não com um tom alarmista, mas com verdade. Explicar os riscos, mostrar os sinais, ensinar a proteger-se — e acima de tudo, estar disponível para ouvir, sem julgamento, quando algo correr mal. Porque vai correr. Vai haver deslizes, excessos, erros. Mas se a relação estiver preservada, se a confiança existir, os nossos filhos saberão que podem voltar para nós. E isso faz toda a diferença.

Gerir o tempo nos ecrãs não é uma batalha contra a tecnologia. É uma jornada de conexão, de equilíbrio, de cansaços e tentativas. Nem sempre vamos acertar. Mas se mantivermos a relação no centro, se soubermos ouvir antes de impor, se formos consistentes sem sermos duros, então estaremos a ajudar os nossos adolescentes a construir uma relação mais saudável com o mundo digital — e, mais importante ainda, consigo próprios.

Inês Saldanha

 
 
 

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